Nova pesquisa relata que o olfato sensível dos cães pode detectar a malária em pessoas contaminadas

De acordo com um novo estudo apresentado na Reunião Anual da American Society of Tropical Medicine & Hygiene, em Nova Orleans, cientistas descobriram que os cães farejadores treinados puderam diagnosticar a presença da malária ao farejar amostras de meias usadas por crianças que vivem em uma área epidêmica da doença na África Ocidental.

“As pessoas com parasitas da malária geram odores distintos em sua pele e nosso estudo descobriu que os cães, que têm um olfato incrivelmente sensível, podem ser treinados para detectar esses odores mesmo quando estão em uma peça de roupa usada por uma pessoa infectada”, diz Steven Lindsay, entomologista de saúde pública do Departamento de Biociências da Universidade de Durham, no Reino Unido, e investigador principal do estudo.

A pesquisa foi conduzida com colegas da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, com o Conselho de Pesquisa Médica da Gâmbia, da Unidade de Londres, e com os especialistas da instituição de caridade Medical Detection Dogs. A instituição de caridade treinou cães para detectar uma variedade de doenças, incluindo câncer de próstata e pessoas em risco de entrar em coma diabético.

A detecção de malária pelo olfato canino teve apoio da bolsa Grand Challenges da Fundação Bill & Melinda Gates, que busca, entre outras coisas, novas formas de diagnosticar a doença de forma não invasiva e rápida. Novas ferramentas são necessárias, pois, após de mais de uma década de reduções drásticas nas infecções e mortes por malária, nos últimos dois anos houve um ligeiro aumento em ambos.

Lindsay disse que o experimento começou na Gâmbia, onde centenas de crianças em idade escolar foram recrutadas para participar do estudo. Elas realizaram exames quanto à saúde geral e, para comprovar a presença dos parasitas da malária, foram equipadas com um par de meias para usarem durante a noite. No dia seguinte, as meias foram coletadas. As meias foram classificadas de acordo com o estado de infecção da malária das crianças que as usaram. Apenas meias de crianças com malária que não tinham febre foram selecionadas, assim como as meias das crianças não infectadas. As meias foram enviadas para o Reino Unido, onde foram armazenadas em um freezer na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres por vários meses enquanto os cães foram treinados.

Freya, da raça Springer Spaniel, foi treinada para detectar parasitas da malária em amostras de meias retiradas de crianças na Gâmbia

Para o teste, os cães treinados foram colocados para farejar as meias das crianças com os parasitas da malária e daquelas que não foram infectadas. Ao detectar o odor da malária, os cães deveram permanecer parados, caso contrário, deveram seguir em frente. Usando apenas as amostras de meias, os cães identificaram corretamente 70% das crianças infectadas e 90% das crianças não infectadas.

Os pesquisadores disseram que a precisão dos cães foi impressionante. Eles estavam identificando crianças infectadas com níveis mais baixos de parasitas do que o necessário para atender aos padrões clínicos dos testes de diagnósticos rápidos estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS). No entanto, no futuro, este trabalho precisa ser expandido com mais amostras testadas de diferentes partes da África.

Mas Lindsay disse que a taxa de sucesso dos cães pode ter sido maior – até 78% – se as crianças com malária carregassem o mesmo tipo de parasita. À medida que as infecções por malária progridem, a parasita passa por vários estágios de desenvolvimento. E Lindsay pensa que, quando se atinge um determinado estágio de maturidade, o odor, reproduzido na pele humana, muda.

Outros testes revelaram que algumas das crianças estavam carregando parasitas mais maduros, porém os cães não foram treinados para detectar o odor do estágio mais avançado. Além disso, os pesquisadores apontaram que a taxa de sucesso poderia ter sido maior se os cães estivessem realmente com as crianças ou, trabalhado com as vestimentas usadas recentemente, ao invés de amostras congeladas por vários meses enquanto estavam sendo treinados.

No entanto, Lindsay e seus colegas disseram que seu trabalho foi projetado apenas para ser uma “prova de estudo de conceito” e mostrar que o diagnóstico da malária por cães é possível. Eles acreditam que, com mais treinamento e mais amostras, os cães poderão ter uma precisão próxima a de um teste clínico. Enquanto isso, Lindsay observou que alguns dos testes clínicos estão sofrendo alguns reveses, pois estão surgindo parasitas mutantes da malária que não produzem mais a proteína específica usadas nesses testes projetados para detectar a doença.

No que se refere à atuação dos cães farejadores em campo, Lindsay disse que eles poderiam ser assistentes úteis em uma campanha de eliminação da malária, na qual requer o tratamento de qualquer indivíduo, de uma aldeia ou comunidade, que ainda carrega os parasitas da malária e daquele que não apresenta os sintomas. Atualmente, a única maneira de abordar o problema dos portadores “assintomáticos” – que ainda podem causar novas infecções ao transmitir seus parasitas da malária à população local de mosquitos – é testar ou tratar uma comunidade inteira.

Lindsay disse que os cães detectores podem ser úteis para, pelo menos, estreitar significativamente o foco dos testes clínicos e dos esforços de tratamento. Ele disse que os cães operariam melhor nos portos de entrada em países que eliminaram a malária ou estivessem perto da eliminação. Por exemplo, os cães poderiam detectar as pessoas contaminadas no sul da África ou em lugares como a ilha de Zanzibar, onde os esforços para eliminar a malária são complicados por causa de um fluxo constante de visitantes que chegam do continente, onde a malária permanece comum.

Ademais, Lindsay acredita que os cães treinados para detectar odores específicos associados à malária poderiam, também, informar o trabalho em andamento, a fim de desenvolver “narizes eletrônicos” artificiais para que possam diagnosticar doenças baseadas no olfato.

O professor James Logan, chefe do Departamento de Controle de Doenças da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, disse: “Preocupante, nosso progresso no controle da malária estagnou nos últimos anos, então precisamos desesperadamente de novas ferramentas inovadoras para ajudar na luta contra a malária”.

“Nossos resultados mostram que cães farejadores podem ser uma forma séria de diagnosticar as pessoas que não apresentam nenhum sintoma, mas que ainda são infecciosas, rápidas e fáceis”.

Para os próximos passos, o grupo está considerando um estudo de acompanhamento no qual irá coletar amostras de pessoas de diversas partes da África, para testar se os parasitas de uma parte do continente apresentam odores diferentes de outras localidades.

“Com essa abordagem inovadora, esses pesquisadores mostram que novas ferramentas para combater a malária podem vir de lugares inesperados”, disse a Presidente da American Society of Tropical Medicine & Hygiene, Regina Rabinovich, MD. “O financiamento para apoiar essas inovações é fundamental para alcançar a meta global de eliminar e, eventualmente, erradicar a malária de seus remanescentes redutos”.

A American Society of Tropical Medicine & Hygiene (Sociedade Americana de Medicina Tropical e Higiene), fundada em 1903, é a maior organização científica internacional de especialistas dedicados a reduzir o ônus mundial de doenças infecciosas tropicais e melhorar a saúde global. Isso é feito através da formação e compartilhamento de evidências científicas, informando políticas e práticas de saúde, desenvolvimento de carreira, reconhecendo a excelência e defendendo o investimento em medicina e pesquisa da saúde global.

(Texto original em inglês)

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