Os riscos de zoonoses por vírus com base no agente e suas características

A princípio, a Saúde Coletiva é o domínio genérico de práticas e conhecimentos organizados institucionalmente em determinada sociedade, direcionados a um ideal de bem-estar das populações, em termos de ações e medidas que evitem, reduzam, e/ou minimizem agravos à saúde, assegurando, desta forma, condições para a manutenção e sustentação da vida.

A Medicina Veterinária do Coletivo representa, assim, uma das áreas mais necessárias da profissão. Por ser muito abrangente, a ciência capacita a lidar com muitas esferas no mundo da Veterinária. Por se tratar de uma área de atuação multidisciplinar, em conjunto com outros setores e profissionais da saúde, educação, meio ambiente e assistência social, coloca o médico-veterinário no centro das responsabilidades.

É uma área nova da Medicina Veterinária que tem crescido cada vez mais no Brasil e no mundo. Representa a área que atua na prevenção, promoção e recuperação da Saúde Coletiva, ou seja, saúde animal, do humano e do meio ambiente. Esta abordagem em Saúde Única se justifica porque surtos de doenças infecciosas, principalmente envolvendo vírus, têm sido praticamente constantes ao longo dos séculos, conforme seres humanos foram se espalhando pelo mundo.

Entendimento correto do agente

Para atingir este objetivo, em primeiro lugar, é fundamental que haja um entendimento correto do agente envolvido.

Vírus são arranjos moleculares com a capacidade de transferir material genético para dentro de células. Apenas determinadas células, com a “maquinária” e “material básico” são capazes de sintetizar um determinado tipo de vírus, conforme codificados por ácidos nucleicos virais.

Ter uma virose significa, no sentido pleno da palavra, estar cheio de vírus (= vírus+ose, sendo “ose” = cheio, muito). É o fenômeno observado em células vivas quando estão sintetizando os produtos codificados por ácidos nucleicos virais.

Considerando que são as nossas células que devem ter a competência para produzir vírus, e não conseguirmos visualizar nossas células a olho nu, podemos imaginar que partículas de vírus são muito menores ainda. Seu tamanho varia muito, estando entre 18 a 2000 nanômetros. De fato, só conseguimos visualizar uma partícula de vírus fazendo uso de ferramentas, microscópios especiais, chamados “eletrônicos”. São equipamentos com potencial de aumento muito superior ao do microscópio óptico. A diferença básica entre o microscópio óptico e o eletrônico é que o eletrônico não se utiliza de luz mas sim de feixes de elétrons. No microscópio eletrônico não há lentes de cristal e sim bobinas, chamadas de lentes eletromagnéticas.

Estruturas simples

Ao microscópio eletrônico se observou que vírus são estruturas simples, se comparados às células, não podendo ser considerados organismos vivos, pois não possuem organelas ou ribossomos e não apresentam todo o potencial bioquímico (enzimas) necessário à sua replicação e nem à produção de sua própria energia metabólica. Não são capazes de crescer em tamanho e nem de se dividir, como as bactérias.

Estas últimas são bem maiores, podendo ser considerados organismos vivos, unicelulares é verdade, mas totalmente independentes.

Destaco aqui que quem replica o vírus é a célula. Esse processo de replicação viral pode ter um tempo de duração variável, sendo que o ciclo de replicação viral varia entre as diversas famílias de vírus, podendo levar poucas horas ou até dias.

Para que uma célula comece a replicar vírus é necessário, em primeira instância, que a partícula de vírus chegue até uma célula competente em produzi-la. Apenas quando receptores da célula interagirem com epítopos, presentes na camada externa do vírus, é que este último é colocado para dentro da célula, e pode se dar início ao processo de produção viral.

Pode acontecer que a célula infectada não tenha a maquinaria ou os insumos adequados, e não saiba fazer vírus direito, possibilitando a produção de vírus um pouco diferente daqueles que originalmente foram capturadas pela célula. Nessas oportunidades, podem ocorrer as mutações dos vírus.

Se partículas de vírus são produzidas de maneira um pouco diferente, isto pode ter consequências enormemente diferentes, como células não mais capturando vírus, ou, ao contrário, mais tipos de células de nosso organismo produzindo vírus um pouco diferentes. Se as células que estão produzindo o vírus são de órgãos que são vitais para o indivíduo, é possível que este organismo não funcione mais adequadamente e até apresente um quadro clínico (doença) e venha a óbito, dependendo do grau de infecção ocorrido.

Veja também: Pandemia reforça importância dos cuidados sanitários na produção animal

O envelope

Assim, verificamos que, em primeira instância, as características mais relevantes de um vírus são os epítopos na sua parte externa ou seu envelope, e como acontece sua replicação dentro de um organismo.

Se aplicarmos substâncias sobre o vírus que destroem estes epítopos ou este envelope, as células não capturam a partícula de vírus, e desta forma a partícula perde sua infecciosidade. Além disso, se a célula com a qual uma partícula de vírus entra em contato não consegue produzir partículas completas e infecciosas, a transmissão de vírus para outras células não acontece.

Fora da célula e do organismo, os vírus são inertes, e pode-se considerar que temperaturas elevadas, que desnaturam proteínas de maneira geral, ou ambientes e substâncias que desidratem estas partículas, dependendo do tipo de vírus, são capazes de modificar sua estrutura em um determinado tempo, e desta forma inativar estes agentes.

Pode-se considerar, pelo acima exposto, que o risco de nós, seres humanos, sermos acometidos de determinada enfermidade cujo agente seja vírus, depende exclusivamente de células de nosso organismo entrarem em contato com este agente.

Animais de vida livre possuem diferentes vírus sendo produzidos normalmente por suas células, geralmente de maneira equilibrada. Eventualmente, com produção concomitante de anticorpos.

Pela invasão do ser humano no ambiente silvestre, ou criando condições para que animais silvestres venham e se estabeleçam no ambiente doméstico e ocasionando stress nos animais (sistema imune deprimido), é perfeitamente possível que vírus presentes em uma espécie animal se estabeleçam em outra, e inclusive que, pela mudança ambiental da “fábrica” (células infectadas), a população de vírus produzida seja um pouco diferente e a patogenia para seres humanos se altere.

O contágio pode, ou não, levar a uma infecção, que por sua vez, pode levar a expressão clínica desta infecção. Na maior parte das vezes, só nos damos conta da presença de vírus no nosso ambiente doméstico quando ocorre a expressão clínica da zoonose.

Concluindo, o risco de sermos acometidos por zoonoses sempre existirá, como entre qualquer outra espécie animal, cão, gato, primatas, enquanto não aprendermos a respeitá-los, estressá-los ao mínimo e manter distância adequada do ambiente no qual se encontram.

Por Phyllis Romijn via Animal Business

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