Professor e médico veterinário responde à matéria publicada na revista IstoÉ

O professor do Instituto Qualittas e médico veterinário, Air Fagundes, escreveu em artigo em resposta à matéria Podridão Sanitária, publicada na revista IstoÉ, no último dia 17 de abril. Confira abaixo o texto de Fagundes e leia aqui a publicação da IstoÉ.

 

       MATADOUROS VERSUS SAÚDE PÚBLICA DOIS (INCOMPLETO)

Professor Air Fagundes – CRMV-RS 0305

 

Mais uma vez “está na mesa” o binômio Fiscalização/Inspeção de Produtos de Origem Animal no Brasil com a matéria da revista IstoÉ, de 17 de abril de 2013, intitulada “Podridão Sanitária”. Provocação que nós, médicos veterinários brasileiros, não podemos aceitar calados.

No artigo que redigi anteriormente, “Matadouros versus Saúde Pública Um”, publicado em alguns veículos de comunicação, terminei dizendo:

“Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”, pois é nessa liberdade que também estou me apoiando, sem intenção nenhuma de ofender ninguém: é a apenas a minha consciência se manifestando mais uma vez.

Nesta versão, “Matadouros Versus Saúde Pública Dois”, começo ratificando essa afirmativa. Por entender que todo ser humano, independentemente da sua área de formação, antes de tudo, é um consumidor e, em parte, comprometido com segurança alimentar da sua família na hora de escolher alimentos sadios e nutritivos. O médico veterinário com razões de sobra. Considerando ter estudado a fundo, acima de qualquer outro profissional, temas diretamente relacionados à qualidade higiênico-sanitária dos alimentos de origem animal que chegam à mesa do consumidor, bem como o que isto representa em termos de sustentação da saúde coletiva, quer seja animal quer seja humana.

A matéria publicada em IstoÉ com o título forte e provocativo de “Podridão Sanitária”, se foi direcionada a algum órgão ou instituição, não deixou de atingir os médicos-veterinários brasileiros cientes das suas responsabilidades e obrigações. Se nos ofendeu, por outro lado, mais uma vez, permitiu abrir um grande debate sobre esse delicado e antigo assunto. Bastando lembrar que a referência pioneira de local apropriado para a realização do abate de animais para o consumo humano no Brasil, os chamados matadouros, é muito antiga. Surgiu, de fato, há 464 anos, quando da construção de Salvador, a primeira capital brasileira. Foi com a chegada dos conquistadores portugueses comandados por Tomé de Souza, no ano de 1549, que desembarcaram na farta e bela baía de Todos os Santos, na Bahia. Logo, após desembarcarem, subiram a colina de 100 metros de altura e de expressivo comprimento e largura, lugar ideal para construir a tão sonhada “cidade-fortaleza”, já que a antiga Vila do Pereira era vulnerável ao ataque inimigo. Como precisavam de alimentos à base de proteína de origem animal, embora com fartura de caça e pesca, construíram o Curral do Conselho, como na época se chamava matadouro, para o abate de gado. Essa instalação rústica ficava em uma baixada nos arredores da porta de Santa Luzia, no limite sul da cidade. Próximo ao local, onde, mais tarde, surgiu o mosteiro de São Bento. Ironicamente, bem depois, serviu de referência para a criação de uma das primeiras escolas de Medicina Veterinária no Brasil, como conta a história. É Interessante observar, não muito diferente ao que acontece em muitos matadouros nos dias atuais, os dejetos decorrentes dos abates eram jogados na nascente de um rio, que ficou conhecido como rio das Tripas. Não menos de dois anos depois da construção desse  primeiro “matadouro” público no Brasil, o curso d’água que banhava Salvador já estava poluído. (Em: A Coroa, a Cruz e a Espada: Lei, ordem e corrupção no Brasil Colônia, de Eduardo Bueno/2006).

Afinal, depois de saber desse fato histórico, o que nos vem à cabeça? A não ser imaginar quantos córregos, riachos, sangas, arroios e rios “Das Tripas” existem hoje espalhados pelo Brasil, em pleno alvorecer do Século 21. Resultado do descaso do homem com a “saúde”, não só dos animais e das pessoas, como também do meio ambiente. Da mesma forma como historicamente começou!

Fazendo um exame de consciência e repassando os deveres, obrigações e responsabilidades da categoria médica-veterinária, permite deduzir que temos poderosas armas nas mãos para dar significativa contribuição para mudar esse quadro que a revista determinou chamar de “Podridão Sanitária”. Claro que não estou dizendo nenhuma novidade! Mas bastaria, quem sabe, dar uma repassada em nossos deveres de casa e lutar para que  as autoridades façam o que lhes compete no campo legislativo, administrativo e judiciário.

É bom lembrar aos mandantes da matéria “Podridão Sanitária” que é muito fácil e cômodo colocar no papel afirmações  dessa natureza: “O problema é que a omissão – ou conivência – dos veterinários com esses matadouros expõe a população a uma série de doenças …”.  Significando jogar, no seio da opinião pública, esse profissional literalmente na lata do lixo, sem contar, o total desrespeito com uma categoria profissional centenária no Brasil, principalmente por ter liderado a criação de um parque industrial de produtos de origem animal que se tornou ganha pão desses “empresários” dos dias atuais. O que mais revolta, e que sabem, já que são empresários de “sucesso”, que a solução definitiva deste problema que se arrasta no Brasil por séculos, está nas mãos das autoridades dos três níveis da esfera pública (municipal, estadual e nacional) e nos três níveis de competência: legislativo, executivo e judiciário. Sem esquecer que o maior erro está no legislativo por ter criado leis inadequadas à realidade em que vivemos; no executivo por não perceber a importância do trabalho do médico-veterinário, como dispensa a outros profissionais da área da saúde. Fazendo do médico-veterinário um “joguete” político e remunerando de uma forma vergonhosa pela importância que representa a serviço da sociedade. Enquanto o judiciário, por fechar os olhos para verdadeira imundice chamada “matadouros” que abala não só a saúde dos seres vivos como compromete a imagem dos dirigentes públicos e denigre o conceito de uma profissão. Todavia, se o judiciário logra efeitos positivos, fechando as portas desses “pseudomatadores”, eles ressurgem das cinzas sem que saibamos claramente com ajuda de que forças.  Claro que não seríamos tão ingênuos ao ponto de generalizar está visão sobre o tratamento dispensado ao médico-veterinário na sua nobre missão de salvaguardar a saúde dos consumidores na garantia de produtos seguros a sua mesa. Existem exceções certamente, poucas, em alguns estados e municípios. Enfim, trata-se de uma questão de segurança nacional, com certeza!

Porto Alegre, 21 de abril de 2013.

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